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Críticas e debates

Resposta à recensão a: Jorge Pedreira e Fernando Dores Costa, D. João VI: O Clemen- te, Lisboa, Círculo de Leitores, 2006

Fernando Dores Costa
p. 285-286

Texto integral

1O autor escreve sobre oito livros e eu refiro-me, obviamente, apenas a um deles, aquele que escrevi (em parceria): a biografia de D. João VI. Não é a ocasião para entrar em diálogo sobre algumas das noções por ele usadas, como a da «humanização» da história, e os equívocos que criam. Sabemos, contudo, que na tendência que designa dessa forma confluem diversas pressões. A biografia escrita por historiadores é uma actividade legítima, mas deve, creio, ser clara na explicitação dos seus limites: não existe uma possibilidade de acesso à intimida- de dos indivíduos, incluindo o modo como «sentiram» os momentos de decisão política. Os seus eventuais «dramas pessoais» face às situações com que se con- frontaram escapam-nos inevitavelmente.

2Quero apenas assinalar que não concebi a redacção do livro sobre D. João VI como um trabalho «revisionista» e não vejo o resultado como estando inserido na «reabilitação» das figuras régias. Um trabalho de revisão pressuporia que tives- se chegado ao historiador de 2006 alguma obra que se pudesse situar no mesmo plano da que tinha pela frente. Mas tal não se verificou. As inúmeras anedotas sobre a figura (que todos sabemos que fazem as delícias dos «divulgadores») ou as imagens de um Oliveira Martins ou de outros, caso dos republicanos, são peças da luta política, nas quais as figuras régias são pretextos para fazer passar, de um modo «popular», as mensagens que desejam impor. O historiador revê interpretações de outros historiadores, não revê fontes. As imagens criadas pela luta política diária devem ser consideradas ao mesmo nível dos panegíricos. O trabalho de redacção do D. João VI foi (passe a imodéstia) fundador – isto sem menosprezar a obra de Oliveira Lima, que é, no entanto, demasiado centrada no período brasileiro da sua vida – e desse modo não reproduz as imagens, negati- vas ou positivas, mas tenta explicar o uso dessas imagens e as decisões em con- texto que aí conduziram. Não podemos, por exemplo, afirmar fundamentadamen- te que D. João era um indivíduo depressivo, sabemos apenas que a referência à doença da mãe e alguns dos seus próprios comportamentos foram, na intriga cortesã, usados contra ele.

3O resultado não é uma reabilitação, é a abordagem de uma figura dentro das regras e dos limites do rigor do trabalho histórico. Pode desprevenidamente aparecer, face às tais imagens «populares» das lutas políticas passadas, como o resultado de uma abordagem benevolente. Na verdade, é apenas porque D. João não é um pretexto, é um problema.

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Para citar este artigo

Referência do documento impresso

Fernando Dores Costa, «Resposta à recensão a: Jorge Pedreira e Fernando Dores Costa, D. João VI: O Clemen- te, Lisboa, Círculo de Leitores, 2006»Ler História, 56 | 2009, 285-286.

Referência eletrónica

Fernando Dores Costa, «Resposta à recensão a: Jorge Pedreira e Fernando Dores Costa, D. João VI: O Clemen- te, Lisboa, Círculo de Leitores, 2006»Ler História [Online], 56 | 2009, posto online no dia 15 outubro 2016, consultado no dia 29 março 2024. URL: http://journals.openedition.org/lerhistoria/2166; DOI: https://doi.org/10.4000/lerhistoria.2166

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Autor

Fernando Dores Costa

Dep. História – ISCTE

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Direitos de autor

CC-BY-NC-4.0

Apenas o texto pode ser utilizado sob licença CC BY-NC 4.0. Outros elementos (ilustrações, anexos importados) são "Todos os direitos reservados", à exceção de indicação em contrário.

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